O explorador da natureza


“Up – Altas Aventuras“, uma das animações mais inteligentes e sensíveis da Pixar, conta a história de Carl Fredricksen, um velhinho de 78 anos, que, ao se ver forçado a ser internado em um asilo, enche milhares de balões em sua casa e faz com que ela levante vôo. Seu objetivo é voar até chegar ao “Paraíso das Cachoeiras”, na América do Sul, onde ele e sua falecida esposa Ellie sonhavam em viver juntos. O grande problema surge então, quando tudo parecia estar correndo bem: Russell, um escoteiro de apenas oito anos embarcara junto
Preconceito contra os mais velhos:
           Por girar em torno da vida de um idoso, rabugento e ranzinza, o filme de Pete Docter – um cineasta norte-americano -, segundo a revista Entertainment Weekly, foi criticado por alguns analistas da indústria, que afirmavam que a história seria um fracasso, pois, para eles, filmes estrelados por velhinhos – contradizendo a figura de super-heróis, príncipes e jovens sonhadores - não teriam chances de sucesso. Assim, a trama retrata a realidade de muitos idosos, que perdem as famílias ou são abandonados e considerados um fardo na vida das pessoas que os cercam, sendo forçados a ir para asilos e abrir mão das coisas que mais amam na vida, como sua casa e recordações, por exemplo.

Saiba mais sobre preconceito cntra os mais velhos:
 http://pt.wikipedia.org/wiki/Discriminação_etária
Uma pesquisa realizada pelo “Jornal Hoje”, no dia 30/07/2008, comprova a tese de que muitos dos jovens, nos dias atuais, consideram, de forma equivocada, os idosos como ultrapassados, incapazes e inúteis, desvalorizando toda a sua experiência de vida e sabedoria. Assim, logo no início do filme, Carl Fredricksen é visto como uma ameaça pública ao tentar impedir que sua casa seja destruída. De acordo com John Lesseter – diretor de animação da Pixar –, a respeito do filme, alguns valores estão se perdendo, mas “Não importa se o protagonista é velho, o que importa é que a história é boa” (LESSETER, John. 2009).
A partir da transposição, da realidade para a fantasia, da vida de alguns idosos, o filme incentiva as pessoas a refletirem sobre essa visão preconceituosa, despertando-lhes o sentimento de respeito e cidadania, pois as conscientiza acerca dos direitos dos velhinhos e sobre o fato de que, um dia, todos irão envelhecer.
O jogo de interesse dos poderosos retratado pelo filme:
O filme também retrata a realidade dos jogos de interesses de muitos empresários e as controvérsias da urbanização. O terreno onde a casa em que o Sr. Fredricksen viveu durante toda a sua vida, ao lado de Ellie, localiza-se em uma área que foi transformada em um grande centro urbano, altamente desenvolvido; isso desperta o interesse de um empresário poderoso, que deseja construir um edifício no local. Esta situação é muito recorrente na sociedade contemporânea, onde as tentadoras propostas milionárias das construtoras para os donos de casas em lugares de grande interesse se opõe aos proprietários de imóveis antigos, tombados ou não, que fazem o que podem para manter viva a memória de uma época que vai ficando esquecida, simplesmente na cabeça de algumas pessoas.
“Com o avanço tecnológico, o crescimento da população, e o conseqüente aumento da demanda por residências e locais para a construção de estabelecimentos comerciais, a típica cidadezinha tranqüila sai de cena e as casas vão sendo substituídas pelos engarrafamentos e arranha-céus, dificultando a memória principalmente em cidades movidas pela força do desenvolvimento e da especulação imobiliária” (LAGROTTA,Cláudio. 2010)
 Decepção perante os ídolos:
            Carl e Ellie se apaixonaram a partir do sonho mútuo de seguir os passos de exploração da natureza do seu ídolo, o pesquisador Charles Muntz; mas ao conhecer o herói de sua infância no Paraíso das Cachoeiras o velhinho percebe que ele não é um homem de caráter de decência. Em paralelo com o mundo da ficção, muitos são os artistas e celebridades que não tem uma postura íntegra ou exemplar; alguns assumem isso publicamente enquanto outros são mais discretos, adotando “máscaras” perante os fãs. A exemplo da cantora Amywine House, que, apesar de seu grande sucesso envolve-se com freqüência em diversos escândalos relacionados com álcool e drogas, frustrando e decepcionando muitos de seus admiradores.  
A perseverança: 
            A perseverança de Carl Fredricksen para chegar ao seu destino é muito notória no decorrer da história, pois ele insiste em ir até o fim em sua missão, tendo em vista que é um sonho pelo qual ele esperou a vida inteira para se concretizar. Muitas são as pessoas que tem essa mesma postura e quando conseguem realizar o que tanto querem ficam extremamente emocionadas. Para viabilizar esse desejo, assim como o casal do filme, recorre-se à chamada “Economia de Cofrinho”, na esperança de um dia conseguir o que lhe é tão valioso. Porém, nem sempre o recurso consegue se manter intacto já que ao decorrer da vida contratempos acontecem, obrigando-lhes a gastar o dinheiro economizado.
A inocência das crianças:
            Para Russel, tudo é divertido e possível, enquanto o Sr. Fredricksen possui uma visão racional diante da facilidade que o menino enxerga nas mais variadas situações. Dessa forma, o comportamento infantil caracteriza-se pela felicidade e despreocupação, justamente pelo fato de as crianças não associarem devidamente o risco e a problemática de alguns acontecimentos. É assim que a história transpõe um notório comportamento da sociedade: a pureza e a inocência dos pequenos. 
O pai ausente :
            Russel representa as crianças que tem pais ausentes e que vivem conseqüentemente na dependência de carinho e atenção, mergulhadas em memórias de momentos felizes que viveram em um passado remoto.
            Talvez por não ter nenhum membro familiar por perto, o Sr. Fredricksen, a partir do conhecimento a respeito da vida de Russel, passa a trata-lo como um filho, aliado ao fato de que o menino não tem uma referência ativa de uma figura masculina, o que pode ser notado na cena do dia de honra ao mérito, em que o pai do garoto não comparece, então o próprio Carl cumpre essa função com o orgulho, mantendo um forte vínculo e assumindo o papel paterno. Essa postura e explicada pela Psicóloga Patrícia Camargo:
É fundamental o papel da família no desenvolvimento da auto-estima dos filhos, pois é nela que desenvolvemos os laços afetivos. É necessário que se proporcione à criança a presença de uma figura masculina: um avô, um tio ou mesmo um amigo confiável, mesmo que o contato seja esporádico. O importante é que haja muito envolvimento afetivo, atenção, carinho e amor (...). As ligações de emoção entre pai e filho são formadas nas relações de afeto e cuidado no dia-a-dia, e não com a parte biológica (...). Sempre que possível, o pai ou figura paterna deve estar presente na vida dos filhos, acompanhando e participando de atividades cotidianas, fortalecendo assim uma ligação que, quer queiramos ou não, é para sempre. (CAMARGO, Patrícia. 2009)

            O filme é uma aventura em busca do redescobrimento de Russel e Carl;Faz uma reflexão acerca da persistência nos sonhos e da importância do amor ao próximo, utilizando-se de ternura e sensibilidade para emocionar e ensinar com aqueles que mais sabem, os mais velhos.